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NOSSAS VISITAS


 

 

Crônicas

Gravata Vermelha
 

          A imponente gravata vermelha do advogado percorria os corredores do fórum. Vinda do estacionamento, onde deixara o seu Honda último modelo, procurava a vara de família. Nossa gravata bacharel não era da cidade, representava um poderoso industrial em um processo de separação judicial. A desavença ocorrera há alguns anos e, desde então, nosso generoso industrial havia gasto uma fortuna para reduzir ao mínimo possível o quinhão que caberia à ex-primeira dama das indústrias ... e aos futuros herdeiros.
 

          A porta se abriu, o sotaque nordestino pediu vênia e logo encontrou guarida no seio da família forense: Juiz, Advogados, assessores e partes. Ao lado do Juiz estava sua assessora Camila, linda, linda e solteira. Camila cursava Direito (quintanista) e estagiava. Face aos seus atributos materiais e imateriais conseguira a condição de assessora do Meritíssimo.
 

          O Dr. Luiz, juiz de carreira, 16 anos de Tribunal (primeiro colocado no concurso), aguardava a promoção para Desembargador em breve. Era casado, pai de quatro filhos, todos estudantes de Direito, ou pelo menos três deles, a filha caçula andava sonhando com Medicina. A esposa, a quem conhecera na primeira Comarca em que foi trabalhar, era dentista, além de ser uma bela e cativante mulher.
 

          Enquanto aguardava o início da sua audiência, sentado em uma cadeira no canto da sala, a gravata vermelha, 40 anos, observava. Notei que ela estava com uma blusa verde, com um decote nem tão generoso, nem tão em desacordo com o decoro requerido pela cerimônia jurisdicional. A forma com que o Meritíssimo se referia a ela me intrigou. Estou acostumado a participar de audiências por este país e nunca tinha visto tanta doçura no tratamento de um juiz de vara de família para com seus assessores.
 

          Senhor Presidente, respondendo a sua pergunta, todo mundo sabe que as relações interpessoais são imprevisíveis, em qualquer campo da atividade humana e nos meios jurídicos não poderia ser diferente. Há inveja, ódio, atração sexual e tudo o mais que é do nosso ser. Sim, sou solteiro. Por que nunca me casei? Talvez por causa do trabalho, não sei... Talvez por nunca ter conhecido a pessoa certa.
 

          Senhor presidente, o que a OAB tem a dizer sobre o caso do assassinato do juiz? Por favor, vamos organizar, coloquem os microfones e gravadores em cima desta mesa. Perguntem cada um de uma vez. O processo está aberto, o acusado já foi ouvido, mas temos que ouvir as testemunhas ainda.
 

          Camila despachava até tarde da noite, porque de manhã tinha faculdade e, como só chegava ao fórum à tarde, precisava esticar as horas.


          Ficamos sabendo do acontecido por intermédio do Oficial de Justiça Carlos que foi até a nossa casa, já passava da meia noite. Normalmente Luiz trabalhava até tarde, de forma que não era motivo de alarde que ele não tivesse chegado em casa até às onze horas, meia-noite.
 

          Ah, sei lá! Os rapazes da minha idade não me atraem, acho-os muito infantis. Talvez seja o tal Complexo de Eletra, pode ser... Com o Luiz, ainda sabendo que ele era casado e que tinha filhos mais velhos do que eu, eu me sentia bem, sabe Bia. Agora eu não sei o que vai ser da minha vida...
 

          Sim Doutor... não Doutor.. Eu não vi movimento diferente nenhum não senhor, o Fórum já tinha fechado já há um tempo... O movimento foi escasseando... Então eu e o Adão saímos apagando as luzes e fechando as portas. Foi aí que ouvimos os barulhos dos tiros, foram dois.
 

          O réu, Meritíssimo, confessou o crime e alegou que agiu da maneira que agiu motivado por ciúmes da senhorita Camila, com quem mantinha um namoro havia seis meses. O acusado disse que o motivo dos ciúmes era o fato de ele desconfiar que Camila continuava o caso que tinha com o juiz Luiz, antes de conhecê-la.
 

          E o Gravata Vermelha? Realmente, a primeira vez que o vi, com aquela gravata vermelha entrando na sala de audiências, fiquei muito atraída por ele. Por um tempo, cheguei a acreditar que poderia dar certo e que a gente pudesse até se casar, mas logo logo percebi que não era bem isso. Pois é... ele me ligava, viajava horas de avião para estar comigo... fiquei sem jeito de terminar com ele, além do mais eu tinha uma vida muito solitária e ele me levava ao cinema, ao shopping...
 

          O que o Senhor presenciou, Sr. Carlos? Eu estava voltando de uma diligência no subúrbio, onde fui intimar uma senhora a mando do MM. Juiz da Vara de Falências. Quando desci do carro na garagem do Fórum, a vigilante Eva dos Anjos veio correndo me informar que eu teria que avisar à viúva o mais rápido possível, então eu nem peguei o elevador. Dali mesmo retornei ao carro e fui até o endereço que estava anotado numa folha de papel com o timbre do Tribunal. Foi só isso, Doutor.
 

          1) Dr. Eduardo, pode descrever qual é o tipo de relação profissional que o senhor mantém com o acusado. Sou advogado por profissão e mantenho, com dois sócios, um escritório de advocacia aqui em Recife e o senhor Gravata Vermelha trabalha em nosso escritório desde que se formou, há mais de 12 anos. 

          2) Dr. Eduardo, o senhor pode relatar algum fato que macule a conduta profissional do acusado? Não senhor, em todos aos anos que trabalha em nosso escritório, nada há que se possa imputar à conduta profissional do senhor Gravata Vermelha.

          3) Dr. Eduardo, com relação à conduta do acusado em sua vida pessoal, há algum fato que a desabone? Não. Pelo menos nada que viesse ao conhecimento do Escritório.
 

          Antes de concluir o inquérito, restava ao delegado ouvir a última testemunha e esta testemunha era Adão, o vigilante que estava em serviço na noite do crime. Adão contou ao delegado que quando ouviu os tiros, saiu correndo para a ala E, de onde vinham os estampidos. Quando abriu a porta da vara de família, a cena que presenciou foi horripilante: a senhorita Camila, semi-despida num canto da sala em prantos. O senhor Gravata Vermelha, com uma arma em punho, girava sobre si mesmo, de cabeça baixa. O juiz Luiz, sentado na sua cadeira, com as calças arriadas, um tiro na fronte e outro tiro na região escrotal e seu pênis todo coberto de sangue.

 

Carlos Eduardo Cardoso
 

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